segunda-feira, 21 de julho de 2014

SIMPÁTICO OU SIMBÓLICO?




  Hoje (7/2/2014), saí para minha caminhada matinal. A preguiça foi tanta que a caminhada não foi tão matinal assim. O sol já ia alto, forte e de uma quentura de amedrontar.  De repente, um ventinho frio arrepiou-me. Prenúncio de chuva, pensei. Andei algumas quadras sob aquele vento gostoso, providencial para arrefecer o calor que assola nosso bairro esses dias, quando uma chuva torrencial desabou.

O calçadão estava lotado. Num minuto, esvaziou-se. Uns se esconderam sob marquises, outros entraram em quiosques, alguns, sob enormes guarda-sóis, outros voltaram pra casa correndo. Enfim, todo mundo fugiu da chuva.
Eu, alegremente, continuei a caminhada, bendizendo aquela chuva maravilhosa. Toda ensopada, era alvo de alegres brincadeiras do pessoal fugido e escondido da chuva, ou seja, eram todos simpáticos. Por que seria, se nos dias anteriores, caminho, caminho, encontro n pessoas no trajeto, nem sequer um cumprimento recebo? Minha caminhada na chuva seria simbólica?
Interessante que eu me lembrei de que acontecia a mesma coisa quando praticava corrida. Ainda não era tão comum as pessoas comuns praticarem caminhadas ou corrida. As academias não eram “obrigatórias” como hoje. Só os atletas profissionais dedicavam-se aos exercícios físicos com afinco. Eis porque eu era sempre parada nas ruas, com brincadeiras, do tipo, vai, Joaquim Cruz!... Vai correndo assim pra onde? Está correndo da polícia? Ou parando o carro ou a bicicleta e oferecendo carona, na brincadeira. Uma simpatia só. E, muitas vezes, correndo na chuva, brincavam comigo, como hoje. Paravam para ver minha cara (acho que pensavam que eu era meio doida) e brincavam: Vai derreter! E quando participei de competição, então? Ganhei medalha de ouro na minha categoria, em corrida de rua de dez quilômetros, e todos me aplaudiam. Depois da competição, chegando ao clube, todos brincavam, riam, falavam comigo.
Simpatia é uma palavra de origem grega.  É formada pelo prefixo sym (juntamente, ao lado de, em favor de, ao mesmo tempo) e pathéia (aquilo que se experimenta em relação às paixões da alma). Então, simpáticas seriam pessoas que nos atraem e conquistam pelo seu carisma, pela sua personalidade ou pela sua postura diante da vida.
Segundo Padre Fábio de Melo (Quem me roubou de mim?), símbolo é toda e qualquer realidade que constrói uma ponte por onde podemos alcançar o outro lado. A palavra vem do grego, sym-ballein, que significa reunir, juntar. E o ato de reunir ou juntar, efetivamente, constrói pontes.
Aí, fui juntando os pontos, construí a ponte para entender por que todos faziam alegres brincadeiras comigo. Eu, naquele momento, era um símbolo. Símbolo talvez da coragem de enfrentar aquela ventania. A minha postura de correr na chuva conquistou aqueles caminheiros que ali estavam. Então, tornei-me simpática por estar fazendo algo inusitado e, ao mesmo tempo, um símbolo para aquelas pessoas que estavam escondidas da chuva.
É interessante observar que todos nós procuramos um ídolo, um símbolo. Seja de alegria, seja de coragem, seja de beleza, enfim, todos querem ser iguais a alguém.  Por isso, brincamos quando vemos alguma pessoa que, por um desses motivos, admiramos: Quando crescer, quero ser igual a você. É uma coisa boa, mas  perigosa, aliás, como tudo na vida. É que sobre a sociedade moderna paira uma sombra. A sombra da falta de identidade, a sombra da ausência de referências.
As crianças de hoje têm ídolos do bem? Mais uma vez, a questão da educação, uma das coisas mais importantes na vida. Pais que se preocupem com os filhos e professores que ensinem seus alunos a pensar, que lhes mostrem um mundo que pode ser do bem, mas que pode ser do mal, dependendo da escolha de cada um.  E só pode escolher quem pensa.
Voltando à minha ousadia, retornei a casa ensopada, mas com o coração leve, por ter tido a ventura de andar na chuva, quando todos fugiram e na sensação (já vem aí a vaidade assumida) de que fui símbolo por um dia, mesmo na minha velhice.

Maria Francisca, fevereiro de 2014.

 

 

 


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